terça-feira, 29 de abril de 2008

Enunciado 23 - Juizado da Capital versus Juizado do Interior - Competência

O Juiz Federal Agapito Machado apresentou crítica a outro enunciado do FONAJEF, dessa vez ao enunciado 23:

"Enunciado nº. 23 - Nas ações de natureza previdenciária e assistencial, a competência é concorrente entre o JEF da Subseção Judiciária e o da sede da seção judiciária (art. 109, § 3º da CF/88 e Súmula 689 do STF)".

Sua crítica foi exposta em decisão por ele proferida. Ei-la:

D E S P A C H O
COMPETÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. ART.109 § 3º da CF/88. JUIZADOS FEDERAIS NO INTERIOR. STF Súmula 689, Enunciado 29 do FONAJEF e Recomendação da Corregedoria do TRF da 5ª.Região contida na CONSULTA Nº 001140023/2007-10, no sentido dos juizados da Capital receberem ações de autores domiciliados em qualquer interior do Estado.

Muito antes da novel CF/88 e, atualmente, no seu art.109 § 3º está prescrito que “ serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicilio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal,e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça estadual”.


A opção conferida pela CF/88, para o autor de beneficio previdenciário escolher o foro para dar entrada em sua ação, na Justiça Federal da Capital ou na Justiça Estadual do seu domicílio, ou seja, em dois (2) foros, tem por escopo facilitar-lhe o acesso, eis que, em 1988 não existia Vara Federal do Interior.


É claro que a CF/ 88 não previu expressamente, pelo menos quando de sua promulgação, que a INTERIORIZAÇÃO DA JUSTIÇA FEDERAL seria um marco no acesso à Justiça, como ora está ocorrendo. A maioria das cidades do interior dos Estados brasileiros é hoje dotada de Vara Federal e com mais de um Juiz e quase que totalmente dedicada às questões previdenciárias.


O artigo 20 da Lei dos Juizados Federais (nº 10.259/01), regulamentador do § 3º do art. 109 da CF/88 (“sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal”), só permite que o autor se utilize de vara federal mais próxima, vedada a aplicação dessa Lei na Justiça Estadual), quando o seu domicílio não for dotado de vara federal, artigo esse nunca declarado inconstitucional pelo STF.


Diante da implantação de Varas Federais nas comarcas do interior dos Estados da Federação, o STF editou a Súmula 689, de 29.9.2003 (DJU 10.10.03,pg. 051) dispondo que “o segurado pode ajuizar ação contra a instituição previdenciária perante o juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da Capital do Estado-Membro”, o que é confirmado pelo Enunciado 23 do FONAJEF e pela decisão em que foi relator o ex-Min. Ilmar Galvão, no RE 293246/RS, Pleno DJ 02.04.04: “tratando-se de litígio contra instituição de previdência social, o ajuizamento da ação, se não ocorrer na Justiça Estadual, no foro do domicílio do segurado, pode ser feito tanto perante o juízo federal da respectiva jurisdição como perante as varas federais de capital do Estado-membro”.


Essa decisão do STF, no RE 293246/RS, além dos dois foros federais, antes admitidos pela CF/88, no caso, o da capital do Estado e o do domicilio do autor, no interior, terminou inovando para criar um terceiro foro, no caso, voltando a admitir o da Justiça Estadual, em afronta ao § 3º do art. 109 da CF/88, da Súmula 689 do STF e do art. 20 da Lei nº 10.259/01, e notadamente afrontando à interiorização da justiça federal.


Não é possível que uma pessoa que tenha domicílio onde existe vara federal no interior, se utilize, nesse mesmo interior, da justiça estadual. Seria abuso de direito porque estaria a escolher o juiz que melhor decidisse os seus interesses, violando o princípio do juízo natural.


Alguns advogados, no seu exclusivo interesse, e não no interesse do autor residente no interior, que sempre foi o destinatário da norma Constitucional (§ 3º do art. 109), estão ajuizando as demandas previdenciárias na Capital das Seções Judiciárias, ao tempo em que requerem a expedição de Carta Precatória para ouvir as testemunhas na justiça federal no interior.


Na prática, o Juiz Federal de Vara do Interior, notadamente dos Juizados Virtuais, termina fazendo parte da colheita da prova, ou seja, trabalhando duro, mas a sentença sendo proferida pelo Juiz Federal da Capital que “ganhará” nas estatísticas ( para quem, no interior, adora estatísticas, sai prejudicado).


Destarte, após a vigência do art. 20 da Lei 10.259/01, jamais declarada inconstitucional pelo STF, se é uma faculdade constitucional a opção do Autor pelo foro federal (do seu domicilio ou da capital dos Estados, sempre excluído o foro federal), dada, também, a competência absoluta dos juizados federais (art. 3º § 3º e parte final do art. 20 da Lei nº 10.259/01), fica complicado o INSS propor exceção de incompetência, objetivando que a ação seja processada e julgada perante o Juiz Federal do interior onde tem domicílio o autor naquela jurisdição.



Sou partidário, todos sabem, da expedição de carta precatória virtual.



Todavia, diante desse fato novo, ou seja, dessa possibilidade escolhida por alguns advogados ( e não pelo Autor) que tende a quase eliminar as Varas Federais no interior dos Estados e porque não vinculante a recomendação da Corregedoria do TRF da 5ª.Região contida na CONSULTA Nº 001140023/2007-10, hei por bem determinar, como ora determino, em prol da celeridade, economia processual e manutenção da interiorização da justiça federal:


a) que se intime o autor para que diligencie, em quinze (15) dias, o cumprimento da carta precatória expedida para o interior do Estado, há vários dias sem cumprimento, ou apresente, por seu advogado, suas testemunhas para serem ouvidas por este Juiz, em data a ser designada,sob as penas da lei;


b) que o advogado, em face do seu exclusivo interesse pessoal de buscar ajuizar ação nesta Vara da Capital, de autor residente no interior, apresente as testemunhas para serem ouvidas por este Juiz, em data a ser designada, sob as penas da lei.


Por este despacho fica claro que este Juiz, doravante, acatará o ajuizamento de ações apenas por parte de autores que residam no interior do Estado que não sejam do interior de Limoeiro do Norte, Juazeiro do Norte e Sobral, onde há vara federal, caso em que continuará a declinar de sua competência de oficio, por se tratar de competência absoluta, nos termos do §ª 3º do art. 109 da CF/88 (“ sempre que a comarca não seja sede de vara federal”), arts. 20, 3º § 3º, da Lei 10.259/01 e Súmula 689 do STF, tudo em prol da manutenção da interiorização da Justiça Federal.


Intimem-se


Fortaleza(CE)


AGAPITO MACHADO


Em reforço à tese defendida por Agapito Machado, apresento decisão da Turma Recursal do Ceará apreciando o conflito de competência resultante dessa discussão:


Processo: 2007.81.00.511057-0
Autor(a)(es): Maria dos Santos de Lima e outro
Réu: INSS
Relator: Juiz Federal George Marmelstein Lima
Assunto: Conflito de Competência

VOTO

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. CAPITAL VERSUS INTERIOR. SEGURADO QUE MORA EM LOCALIDADE ABRANGIDA POR JURISDIÇÃO DIVERSA DAS VARAS DA CAPITAL. IMPOSSIBILIDADE DE INGRESSO NA CAPITAL.


A súmula nº. 689 do STF dispõe que: “o segurado pode ajuizar ação contra a instituição previdenciária perante o juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da Capital do Estado-Membro”.


Referida súmula não se aplica aos juizados especiais federais, vez que a competência, no caso, é absoluta, fixada objetivamente, mediante critérios territoriais, pelo Tribunal Regional Federal.


O TRF, ao realizar a delimitação territorial das competências, utilizou dados objetivos (população, distância, número de ações), de modo que não é razoável permitir a alteração da competência territorial por escolha pessoal da parte.


A faculdade contida no art. 109, §3º da Constituição abrange tão-somente o foro da capital federal (Distrito Federal) e não o foro da capital do Estado.


Entendimento contrário levaria a uma situação favorável às fraudes e burlas ao princípio do juiz natural, não se podendo admitir que um juiz tenha sua jurisdição subtraída pelo simples fato de possuir um posicionamento jurídico contrário à pretensão da parte.


Ante o exposto, conheço do presente conflito de competência para declarar competente o juízo da 15ª Vara Federal, em Limoeiro do Norte/CE, tendo em vista ser o foro abrangido pelo município em que mora o autor da ação.



ACÓRDÃO



ACORDAM os Juízes da Turma Recursal da Seção Judiciária do Ceará, em conformidade com o voto escrito do Relator e os votos orais dos demais membros, por unanimidade, fixar como competente o juízo da 15ª Vara Federal para processamento da presente ação.



Fortaleza,



George Marmelstein Lima
Juiz Federal – TR2

Um comentário:

George Marmelstein disse...

Acredito que um ponto importante nessa discussão é saber qual é o intuito da propositura da ação na capital ao invés do interior. Se o motivo for facilitar o acesso à Justiça, aparentemente seria ilegítima qualquer decisão que dificultasse essa escolha.
O problema é que não é bem assim. O que se percebe é que, em determinadas situações, as pessoas "fogem" dos juizados do interior não porque querem um julgamento mas célere, mas porque os juízes do interior, que estão mais acostumados com esse tipo de demanda, são, em regra, muito mais criteriosos na concessão de benefícios do que os juízes da capital, embora isso nem sempre seja verdade.
Veja bem. Não estou querendo dizer que os juízes da capital não pró-segurado, até porque isso não tem nada ver com ser do interior ou da capital. O que quero dizer é que os juízes lidam diaramente com tentativas de fraudes e, portanto, já conhecem mais de perto as "malandragens" das partes. É o que penso.